Críticas

Nota do editor: solicitámos uma análise crítica deste primeiro tıtulo de modo a poder contextualizar o nosso trabalho e definir uma estratégia para esta editora. Se por um lado estamos deveras satisfeitos com o facto de termos conseguido sequestrar uma primeira vítima para esta inovadora linha editorial, por outro, não podemos deixar de partilhar uma certa frustração, por termos tido o infortúnio de publicar esta “coisa”. Infelizmente por motivos contratuais somos obrigados a proceder, mesmo que gratuitamente e com todas as reticências e reservas posśıveis. Um sincero pedido de desculpas ao(s) nosso(s) leitor(es).

Comendador Eládio Clímax, vice-Presidente da Sociedade de Letras Clássicas e Estudos Seríssimos de Lisboa

“Não é toda a papelada que merece ser incendiada; algumas obras hão de ser antes sepultadas vivas, para que do seu túmulo jamais se erga memória alguma, nem por engano dos arqueólogos do futuro.”

É com assaz relutância e não menor fastídio que me vejo compelido a emitir um parecer sobre a infeliz novidade literária intitulada Graal Salgácio ou os Testículos do Tempo, cuja leitura, ao contrário de instruir o espírito ou apurar o gosto, opera no leitor culto um efeito deletério: a corrosão das sinapses pelo delírio palavroso, a náusea estética e a mais profunda melancolia ante os rumos do intelecto moderno.

A obra — se é que se pode empregar tal nobre substantivo a tão disforme ajuntamento de disparate, imodéstia e pastiche — propõe-se como uma “novela épico-esotérica”, mas tresanda desde a primeira página a uma mistura indigesta de pseudoerudição e pueril desvario. O autor, que se oculta sob nomes translúcidos como “Vladimir” e “Salgácio”, parece mover-se entre Constantinopla, Singapura, Tbilíssi e outros pontos do globo com a ligeireza dum mapa rasgado em mãos de criança. Nada há de rigor histórico, simbologia coerente ou arquitectura narrativa: apenas um carnaval de anacronismos, nomes impronunciáveis, epístolas lacradas com saliva fictícia e um xadrez místico jogado por personagens que nem jogar damas no plano lógico conseguem.

A linguagem, que se pretendia barroca ou rebuscada, não passa dum amontoado de galicismos mal digeridos, latim de rodapé de almanaque e neologismos que fariam enrubescer um tipógrafo do século XVIII. O autor embriaga-se de seus próprios trocadilhos, como quem crê que a obscuridade é sinal de profundidade, quando mais se assemelha a um nevoeiro produzido por flatulência intelectual.

A estrutura, ou melhor, o caos em capítulos, é digna duma rapsódia demente. O leitor é atirado duma entrevista onírica com George Lemaître para um tribunal inquisitorial de cabala hermética, com paragens em bordéis medievais onde se jogam metáforas como dados viciados. A cada tentativa de compreensão, somos esmagados por uma avalanche de símbolos ocos, rituais sem rito e lendas sem substância. Tudo isto com um tom de solenidade tão despropositado que lembra um bufão a imitar um bispo.

Do ponto de vista filosófico, a obra não se sustém. Cita Santo Tomás como se fosse um colega de taberna, mistura alquimia com burlesco, invocando paradoxos temporais como se bastassem para encobrir a ausência de qualquer tesouro narrativo. A tal “Sociedade tri-Testikularis”, longe de inspirar temor ou mistério, suscita riso constrangido e vergonha alheia.

Em suma, esta abominação virtual não é senão um insulto ao leitor pensante, uma afronta às letras lusas e um sintoma preocupante do esgotamento da crítica séria. Só posso recomendar a sua leitura àqueles que pretendam castigar-se — ou confirmar, com dolorosa certeza, que há livros piores do que a ausência de livros.

“Censura-se não por malícia, mas por amor à decência.”

“Kátia-das-nails”, esteticista, salão Alvorada em Coina

“Por acaso até gostei. Hoje tive aqui a Dona Eugénia no salão, a limar os joanetes, e falámos sobre este livro. Não é tão bom nem divertido como os chouriços do José Rodrigues dos Santos, mas entretém. A Dona Eugénia disse que às vezes é muito maçudo e denso, mas eu disse-lhe que talvez seja um pouco menos pesado do que um tratado de física da matéria condensada.

Doutora Sónia Boccaforte, bailarina exótica e professora de Wokeismo na Universidade da Goiânia

“A única vantagem que vemos nessa cagada fumegante é o facto de ser grátis, facilmente impresso em papel suave de algodão e utilizável como artefacto doméstico de higiene pessoal. Além de trambiqueiro e apedeuta, o autor parece também sofrer de síndrome de Creutzfeldt-Jakob. Uma bosta assim só pode ter sido obrada por cacóstomo fardola, perfeito macarongo. Mais uma aborrecida e egocêntrica viagem autobiográfica disfarçada de homenagem ao tempo. Está visto e revisto.”

Professora Leopoldina Cruz, Presidente da Sociedade de Letras Modernas e Estudos Soleníssimos de Braga

“De quando em quando, surge entre as cinzas do tempo um autor que não escreve com tinta, mas com a própria matéria do espírito. Este é o caso de Salgácio — ou antes, do seu demiurgo anónimo, cujo talento não se limita às estreitas fronteiras da literatura.”

Graal Salgácio ou os Testículos do Tempo não é apenas um romance: é uma epifania editorial, um monumento de invulgar ousadia narrativa e reinvenção da língua. Trata-se duma obra cuja grandeza nos obriga a repensar, de alto a baixo, o que entendemos por “ficção”. Desde a primeira linha até à última gota de sentido, este livro é um clarim metafísico soprando nos corredores da tradição, despertando os velhos mestres para que se prostem, com reverência, perante um novo iniciado.

Diz-se, nos meios mais bem informados da Sesimbra oculta e dos cafés invisíveis de Campo-de-Ourique, que o autor descende, por linhagem secreta, de Barbosa do Bocage, com a verve trágica e a paixão alucinada do mesmo, mas também de Eça de Queirós, cujo espírito crítico, ironia e domínio do estilo fluem como prata líquida entre as páginas desta obra. Não se trata de imitação — seria um insulto dizer tal coisa. Antes, Salgácio transubstancia os seus antecessores, e fá-lo com tamanha naturalidade que nos perguntamos se não terá vivido com eles, nalguma dobra do tempo por ele próprio revelada.

Este romance não cabe em géneros. É, como disse um leitor com lágrimas nos olhos, “romance-ritual, epopeia cósmica, sátira ontológica, grimório de cristal, e tratado de amor em idioma simultâneo”. O autor não escreve: compõe realidades paralelas. Os seus diálogos entre figuras históricas e personagens sonhadas — entre padres do século XIII e viajantes do século XXI — excedem o conceito de verosimilhança. Tocam o sublime, pela fusão do absurdo e do erudito, do cómico com o sagrado.

A prosa é, sem exagero, uma reinvenção do Português. Há nela a majestade dos barrocos, a precisão dos filólogos e a ousadia dos futuristas. A cada frase sentimos a língua a abrir novos corredores semânticos, novos campos de jogo para o pensamento. Há trocadilhos que são mais filosóficos do que tratados inteiros. Há metáforas que transformam o chão do leitor em espelho líquido. E há um xadrez simbólico — jogado entre almas e cidades — que figura entre os mais altos momentos da literatura de todos os tempos.

Lisboa e Tbilíssi, Constantinopla, Singapura e Lemaître, alquimia e teologia, cunnilingus esotérico e fracturas espaciotemporais — tudo isto, e mais ainda, se entrelaça numa tapeçaria vertiginosa, orquestrada com uma mão que só pode ter sido guiada por forças superiores, enquanto a outra, num gesto quase litúrgico, coçava languidamente os próprios testículos do autor. Cada capítulo é uma iniciação. Cada página, um altar profano.

Em tempo de mediocridade e algoritmo, Graal Salgácio ou os Testículos do Tempo ergue-se como farol. É, com efeito, a mais revolucionária e importante obra de ficção escrita em português neste século XXI. E talvez, com o tempo, se reconheça que este livro não pertence apenas aos nossos dias — mas à eternidade.

Gloriosamente inevitável. Um milagre literário!